Não teremos oportunidade de aplaudir!

Imagem: Dmitry Trepolsky
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Por GILBERTO LOPES*

A OTAN prepara-se para uma guerra que não pode vencer, enquanto o resto do mundo atua como meros espectadores de uma peça sobre o nosso fim

“Norte-americanos para dentro, russos para fora, alemães para baixo”. Assim Lord Ismay – Hastings Lionel Ismay, 1º Barão Ismay, general do Exército Britânico, primeiro secretário-geral da OTAN (1952-57) – definiu os objetivos da organização, fundada em 1952, em plena Guerra da Coreia e no início da Guerra Fria.

Como adverte Victor Davis Hanson, historiador da Hoover Institution da Universidade de Stanford e autor de The Second World Wars: how the first global conflict was fought and won, Lord Ismay não se referia a deixar de fora a União Soviética (que uma vez tentou, sem sucesso, aderir à OTAN), mas sim os “russos”. Nem a Alemanha do Leste, ou os nazistas. Simplesmente os “alemães”.

Num artigo publicado em julho de 2017, Victor Davis Hanson argumenta que Lord Ismay entendia que, encurralada entre a Alemanha e a Rússia, a Europa precisava de um aliado externo poderoso para evitar novos conflitos. Esse aliado era os Estados Unidos, então tentados pelo isolacionismo diante do risco de se envolverem em outra guerra europeia. Uma preocupação que o eventual triunfo de Donald Trump em novembro próximo despertará novamente. O que Victor Davis Hanson não diz é que impedir o surgimento no continente europeu de uma potência que pudesse desafiar Londres foi sempre um objetivo fundamental da política externa britânica moderna.

Por alguma razão, diria Victor Davis Hanson, tanto a ex-primeira-ministra britânica Margaret Thatcher (1979-90) como Mikhail Gorbachev, secretário-geral do Partido Comunista da União Soviética (1985-91), estavam preocupados com a unificação alemã em 1989. Seja para Lord Ismay, Thatcher ou Gorbachev, uma Alemanha dividida parecia mais segura. Embora a Alemanha seja atualmente, em muitos aspectos, um “modelo de democracia”, não se deve esquecer certas “raízes” que sugerem que a história pode se repetir, acrescentou Victor Davis Hanson. O general Ismay não deixou de lembrar da guerra franco-prussiana de 1870-71, nem do papel da Alemanha nas duas guerras mundiais.

Uma Europa com perfil alemão

O objetivo da OTAN de manter “os alemães embaixo” não foi alcançado. A unificação alemã em 1990 e o Brexit, aprovado num referendo em 23 de junho de 2016, através do qual o Reino Unido decidiu sair da União Europeia, são duas expressões deste fracasso. Catorze anos antes do Brexit, em 1o. de janeiro de 2002, o Euro, a moeda única que a Grã-Bretanha nunca adotou, entrou em circulação em doze Estados europeus. Começava naquele momento sua retirada de uma Europa que se organizava cada vez mais com um perfil alemão.

O euro foi a espinha dorsal desta construção. Uma moeda comum que evitava a valorização de uma moeda nacional, como o marco, tornando mais caras as exportações de um país que mantinha um superávit comercial crescente, como era o caso da Alemanha. O banco central alemão controlava de fato as finanças europeias, diz Victor Davis Hanson. As economias mediterrâneas empobrecidas estavam atreladas à Alemanha, que via o Brexit como “uma afronta intolerável à sua liderança”.

As análises sobre o efeito do euro nas economias europeias são abundantes e não é possível analisá-las aqui em detalhe. Sugiro o texto de Joseph Stiglitz, prêmio Nobel de Economia e autor do livro O euro. Como a moeda comum ameaça o futuro da Europa, publicado em 2017. Segundo Joseph Stiglitz, para salvar o projeto europeu, o euro tinha que ser abandonado. O euro tornou os países mais fracos ainda mais fracos e os mais fortes cada vez mais fortes, disse Stiglitz.

O PIB da Alemanha, que representava 10,4 vezes o da Grécia em 2007, passou a 15 vezes em 2015. Adam Tooze, um historiador econômico britânico, já tinha assinalado, em setembro de 2012, na revista Foreign Affairs, que o crescimento da Alemanha era insustentável porque grande parte de seu superávit era obtido à custa do déficit em conta corrente dos países europeus em crise.

A Alemanha via o enorme superávit comercial – de que se beneficiava desde 2000 – como uma forma de retornar aos velhos dias de glória posteriores à Segunda Guerra Mundial. Mas depois, diz Adam Tooze, investiam no próprio país. Em 2012, a Alemanha investia mais no estrangeiro do que em casa. Nesse sentido, o superávit não era uma repetição do modelo de crescimento do pós-guerra, “mas um sinal de sua descomposição”.

Talvez em nenhum outro cenário essa Europa “alemã” foi retratada de forma mais dramática do que nas condições impostas à Grécia na renegociação de sua dívida em 2015, com o ministro das finanças alemão Wolfgang Schäuble (2009-2017) desempenhando um papel agressivo na imposição de cortes drásticos nos gastos públicos, privatizações e a obrigação de fazê-los pagar até o último centavo da dívida. Os governos da zona do euro não queriam ver qualquer tipo de renegociação, um alívio da dívida grega.

Gradualmente, tornou-se claro de que se tratava tudo isso. O FMI tinha decidido proteger os bancos afetados, sobretudo alemães e franceses, expostos à dívida grega. A economia grega foi sacrificada para salvar o projeto do euro e o sistema bancário do norte da Europa. Mario Draghi, então presidente do Banco Central Europeu (BCE), reconheceu que os países da zona do euro tiveram lucro de 7,8 bilhões de euros graças às condições que impuseram à Grécia na renegociação de sua dívida. Berlim ganhou cerca de 2,9 bilhões de euros com a crise grega, graças à sua parte nos lucros gerados pelo programa do Banco Central Europeu de compra de títulos da dívida grega.

Enquanto isso… como a Inglaterra se saiu?

Em 2018, a primeira-ministra britânica Theresa May negociava com a Comissão Europeia os acordos para a saída da Grã-Bretanha da União Europeia após o referendo de junho de 2016. “No famoso jantar de Theresa May em Downing Street com o presidente da Comissão Europeia, Jean-Claude Juncker, a primeira-ministra argumentou que eles deveriam se comprometer a fazer do Brexit um “sucesso”. Juncker, perplexo, lembrou a ela que isso era impossível, pois “ambos os lados sairiam perdendo”. O luxemburguês Juncker era o mesmo que, junto com o alemão Schäuble, tinha se enfurecido contra a Grécia três anos antes na renegociação da dívida.

Em novembro de 2022, o Banco da Inglaterra alertou que o Reino Unido enfrentava um cenário “muito desafiador” para sua economia e que o desemprego quase dobraria até 2025, passando de 3,5% para quase 6,5%. Embora não fosse a recessão mais profunda de sua história, seria a mais longa desde que os registros começaram na década de 1920, disse o banco central. O governo conservador de Rishi Sunak anunciava novos cortes de gastos e aumentos das taxas de juros. A oposição trabalhista alertou que as famílias não seriam capazes de suportar estes aumentos, que os preços dos alimentos e as contas de energia estavam subindo e que agora enfrentariam taxas hipotecárias mais altas.

Naquele momento, já se lia na imprensa britânica que milhões de pessoas estavam sendo forçadas a abandonar refeições (ou passar o dia inteiro sem comer). Uma em cada quatro famílias com crianças vivia em insegurança alimentar. Em outubro de 2022, a BBC publicou um artigo intitulado “Ratos, ossos e lama: os alimentos da fome que as pessoas desesperadas estão comendo para sobreviver”. “Há pessoas comendo ração para animais de estimação e aquecendo a comida com velas”, dizia outro artigo, dois meses depois, comentando os efeitos da inflação no Reino Unido.

Com a economia praticamente estagnada, o FMI prevê um crescimento do PIB de 0,6% em 2024. A OCDE projetou uma contração de 0,4% em 2023 e um crescimento mais modesto de 0,2% em 2024. Uma pesquisa de opinião do Observer constatou que 41% dos entrevistados achavam que a Grã-Bretanha tinha se tornado menos influente nos últimos dez anos. E 19% achavam que mais influente. Já 35% achava que o Brexit a tinha tornado menos influente, em comparação com 26% que pensavam o contrário.

As previsões da Comissão Europeia para a economia da região também não são otimistas. “A estagnação significativa da União Europeia ao longo de 2023 se traduziu num fraco impulso para o novo ano. (…) a economia da União Europeia entrou em 2024 numa situação mais fraca do que o previsto, e os últimos indicadores não sugerem uma recuperação iminente”. Esse não era o cenário imaginado pelos britânicos quando a OTAN foi criada há 75 anos.

Os russos… para fora ou derrotados?

Não se trata mais de deixar os russos fora da OTAN, como argumentava Lord Ismay. Agora, o objetivo de seus países membros é derrotar a Rússia. Algo muito mais ambicioso – e perigoso.

“A era do pós-guerra acabou”, disse o primeiro-ministro polonês Donald Tusk numa reunião do conservador Partido Popular Europeu (PPE) em Bucareste, Romênia. “Estamos vivendo novos tempos: uma era pré-guerra”. “Ou lutamos para proteger nossas fronteiras, território e valores, para defender nossos cidadãos e as gerações futuras, ou [aceitamos] a alternativa que é a derrota”.

A derrota da Rússia “é indispensável para a segurança da Europa”, acredita também o presidente francês. “A Europa está em pé de guerra”, diziam, entusiasmados, dois correspondentes do diário espanhol El país. “Mais munição, mais produção de armas, mais investimento e coordenação nas capacidades de defesa”.

A presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, garantiu ao Parlamento Europeu que “a ameaça de guerra pode não ser iminente, mas não é impossível”. Para os jornalistas espanhóis, esse é um grãozinho a mais, uma contribuição para a mudança de paradigma, um aviso aos cidadãos europeus para que se preparem mentalmente para a guerra, como pediu o governo sueco, que recentemente aderiu à OTAN.

Para qual guerra os cidadãos europeus devem se preparar?, deveríamos nos perguntar na América Latina, e no mundo todo. Aqueles que pretendem se preparar para uma guerra entre a Rússia e a OTAN estão em seu juízo perfeito? Estão falando sobre a necessidade de produzir mais munição ou sobre uma mudança de paradigma? De que munição estão falando, de que paradigma?

Para o chanceler russo, Sergei Lavrov, a corrente dos partidários da guerra é muito forte na Europa. Putin reiterou que não tem intenção de travar uma guerra com a OTAN, que será inevitavelmente uma guerra nuclear.

Há quem pense que, ao militarizar ainda mais a Europa e cercar as fronteiras da OTAN com a Rússia, todos estaremos mais seguros. A advertência de Von der Leyen, dizem os jornalistas espanhóis, é apenas a última “de uma série de declarações contundentes alertando sobre o risco do presidente russo Vladimir Putin atacar um país europeu”.

Os avisos têm o mesmo tom, mas nunca são precisos: “Nossos especialistas preveem que isso pode acontecer dentro de cinco a oito anos”, de acordo com o ministro da defesa da Alemanha, Boris Pistorius. Para o ministro da defesa da Dinamarca, Troels Lund Poulsen, “o hipotético ataque poderia acontecer ainda mais cedo”.

Conservadores e socialistas

Os jornalistas entusiasmam-se com o que consideram “um passo histórico” da União Europeia para apoiar militarmente Kiev com fundos intergovernamentais. Ou que o Banco Europeu de Investimentos mude sua política de empréstimos “para financiar empresas que fabricam armas e munições”.

O Ocidente tem aumentado progressivamente sua participação na guerra: fornece artilharia de longo alcance, sistemas avançados de defesa aérea, tanques, mísseis de cruzeiro e inteligência por satélite. Para o chefe do serviço de inteligência da Estônia, o Kremlin está “provavelmente” antecipando-se para um “possível” conflito com a OTAN na próxima década, “ou algo assim…”. “Os ministros da defesa da Dinamarca e da Alemanha também alertaram que a Rússia poderia atacar a OTAN em menos de uma década”.

“Estamos no amanhecer de uma nova era, mais turbulenta e difícil”, disse a primeira-ministra dinamarquesa Mette Frederiksen no congresso dos socialistas europeus em Roma. Vladimir Putin é o “grande desestabilizador”. “A Rússia ataca onde sente o cheiro de fraqueza”. Portanto, é uma questão de unir forças contra ele.

É o mesmo congresso em que o luxemburguês Nicolas Schmit será indicado como candidato do Partido Socialista Europeu (PES) para a presidência da Comissão. Para a qual os conservadores indicarão a atual presidente como candidata à reeleição. O Parlamento Europeu será eleito em junho próximo e se encarregará de eleger os altos funcionários da Comissão. De acordo com a grande mídia europeia, os conservadores não apenas têm a maioria garantida, mas, ao se moverem ainda mais para a direita, consolidarão um bloco maior do que o atual.

Nicolas Schmit foi categórico: “Não pode haver compromisso com a extrema direita, nem com aqueles que a apóiam e protegem”. Em seguida, acrescenta: “Não podemos aceitar que nossos filhos estejam expostos a ameaças permanentes (de Vladimir Putin), a chantagens permanentes de uma potência (a Rússia) que é uma potência imperialista e, por causa de suas orientações, uma potência fascista”.

Ninguém fala do avanço permanente da OTAN em direção às fronteiras russas, do Maidan ucraniano de 2013-14, estimulado pelos Estados Unidos. Somente sobre a “ameaça russa”. “A defesa da Ucrânia é essencial para a estabilidade europeia e para impedir a expansão do poder global russo. Conter a Rússia na Ucrânia significa manter a linha de contato o mais próximo possível da fronteira russa, restringindo as tendências expansionistas russas”, argumentam quatro acadêmicos do Center for Strategic and International Studies (CSIS), uma organização com sede em Washington.

“A Europa se reafirma”, de acordo com jornalistas espanhóis. Em 2014, quando a Rússia anexou a Crimeia, o orçamento militar dos aliados europeus da OTAN era de 235 bilhões de dólares: 1,47% do PIB. Em 2023, a quantia subiu para 347 bilhões de dólares, equivalente a 1,85% do PIB. Até 2024, são esperados 380 bilhões de dólares. O que representa 2% do PIB. Número já considerado insuficiente pelos países europeus.

A ameaça russa

A Rússia é uma ameaça real à OTAN?, perguntavam-se Andrea Kendall-Taylor, diretora do Programa de Segurança Transatlântica do Center for a New American Security, e Greg Weaver, ex-diretor do gabinete do subsecretário de defesa para políticas, num artigo publicado em 5 de março no Politico.

Eles não duvidavam disso. Em seu artigo, procuraram analisar como os aliados da OTAN deveriam se preparar para uma agressão russa que, apesar de todas as evidências em contrário, eles consideravam altamente provável. Weaver e Kendall-Taylor citam o ex-chefe do Estado-Maior Conjunto dos Estados Unidos, general Mike Milley, explicando que, embora os custos de dissuasão da agressão sejam altos, os custos de uma guerra de grandes proporções são muito maiores. Estão preocupados em ter que lutar em dois cenários: Europa e Ásia. Para isso, é necessário garantir a capacidade de transportar e abastecer suas forças, por mar e ar, para o teatro de batalha e ter munição convencional suficiente para manter sua superioridade.

Fyodor Lukyanov, diretor do Grupo de Debates Valdai, sugere outra visão do problema. A elite governante ocidental de hoje é muito diferente daquela das gerações anteriores, pois acredita em sua infalibilidade. Acredita que qualquer desvio das normas políticas e ideológicas estabelecidas após a Guerra Fria seria “uma verdadeira catástrofe para o mundo”. E como qualquer compromisso com os russos significaria isso, “é necessário que seja evitado a qualquer custo”. “Os Estados Unidos não conseguiram lidar com a responsabilidade de ser a única superpotência do mundo no final da Guerra Fria”, disse Vladimir Putin no recente Festival da Juventude em Sochi.

Fyodor Lukyanov se refere à origem dessas ideias, à mentalidade do “fim da história” que prevaleceu com o fim do socialismo no leste europeu. O mundo parecia estar se movendo numa única direção, até que foi confrontado com uma nova realidade, com Estados capazes de se opor e bloquear esse movimento.

Durante vinte anos, a Rússia tentou fazer ver a necessidade de reacomodar a ordem internacional. Esses avisos foram ignorados. O resultado foi o que aconteceu em 24 de fevereiro de 2022, quando suas tropas entraram na Ucrânia. A Rússia agora está tentando, com força militar, obrigar o Ocidente a rever sua abordagem da década de 1990, para buscar um novo acordo sobre o cenário de segurança europeu, diz Fyodor Lukyanov. A retórica cada vez mais estridente do Ocidente sobre a inaceitabilidade de uma vitória de Moscou é alarmante. “Estamos entrando num período perigoso”, em sua opinião.

Para o diplomata indiano Kanwai Sibal, ex-embaixador na Rússia (2004-07), os países membros da União Europeia prometem mais armas para a Ucrânia, ao mesmo tempo em que se recusam a aceitar a afirmação de Moscou de que não têm planos de atacar nenhum país da OTAN. Pensam que, ao aumentar o nível de confrontação, forçarão Moscou a sentar-se à mesa de negociações. “Isso pode ser um grave erro de avaliação”, disse ele. Longe de forçar uma solução negociada para o conflito, essa lógica pode levar inexoravelmente a um confronto entre a Rússia e a OTAN. O argumento é que, se a Rússia vencer, ela atacará outros países para satisfazer suas ambições imperialistas.

“Alguém nesta sala acha que Putin vai parar na Ucrânia? Eu garanto que não”, disse Joe Biden em seu discurso sobre o estado da União em 7 de março. A frase me lembrou a do então secretário de estado Colin Powell que, em 5 de fevereiro de 2003, exibiu perante o Conselho de Segurança da ONU uma amostra de antraz, supostamente do arsenal de Saddam Hussein, outro argumento para justificar, um mês e meio depois, a invasão do Iraque. São argumentos falsos, diz Kanwai Sibal. “Putin está no poder há 24 anos, a OTAN se expandiu cinco vezes, suas tropas e os mísseis norte-americanos estão estacionados perto das fronteiras russas, sem nenhuma resposta agressiva da Rússia”. Ninguém explica agora por que a Rússia estaria interessada em atacar a OTAN.

Vladimir Putin alertou o Ocidente sobre os riscos de suas políticas, especialmente o avanço da OTAN em direção às suas fronteiras. Ele fez isso em 2007, em seu discurso na conferência de segurança de Munique, e tem feito isso desde então. Sua última oferta de um acordo, em dezembro de 2022, dois meses antes da invasão da Ucrânia, foi rejeitada.

O Ocidente acredita que Moscou não responderá militarmente se o Ocidente continuar aumentando seu apoio à Ucrânia. “Isso pode ser um grave erro de avaliação; pode explicar por que os europeus não tomam a devida nota do formidável aparato nuclear da Rússia”. “Isso”, disse Kanwai Sibal, “poderia arrastar o Ocidente e o mundo inteiro para o pesadelo nuclear”.

A OTAN prepara-se para a guerra

O fato da Rússia não ter os meios para realizar suas ambições neoimperialistas não a impede de alcançá-las até um fim amargo, disse Joschka Fischer, ex-ministro das relações exteriores e líder dos verdes alemães (que agora ocupam essa pasta novamente, com a ex-peacenik Annalena Baerbock). Com relação às ambições neoimperialistas, as lições mais recentes da história revelam que o que Joschka Fischer atribui à Rússia se encaixa melhor no comportamento alemão. Ambições imperialistas que nos levaram a intermédios amargos, mas que, repetidas, podem levar ao fim amargo ao qual o político alemão se referia.A União Europeia já não é apenas um projeto de paz. A Europa deve se preparar para a guerra. Este programa não contradiz o objetivo inicial de evitar a guerra na Europa, disse Riho Terras, membro conservador do Parlamento Europeu e ex-comandante militar da Estônia.

A Comissão Europeia acaba de apresentar uma Estratégia Industrial de Defesa, juntamente com um fundo de subsídio de pelo menos 1,5 bilhão de euros para um Programa Europeu de Investimentos em Defesa. Mas será necessário muito mais para que a Europa crie um complexo industrial competitivo, de acordo com o Comissário da Indústria da Comissão Europeia, Thierry Breton. Seriam necessários cem bilhões de euros. Outros diplomatas europeus consideram que isso está além das possibilidades.

Quando a OTAN foi criada, os Estados Unidos eram uma potência em expansão. Foi seu momento de maior proeminência no cenário internacional. Controlavam cerca de 50% da indústria mundial. Em 1999, dez anos após o fim da Guerra Fria, Bill Clinton (93-2001) anunciou que os Estados Unidos tinham um futuro brilhante e próspero pela frente. Isso parecia certo: o país estava mais rico do que nunca.

Desde então, sua participação na economia mundial, sua produtividade, vem caindo constantemente, enquanto sua indústria manufatureira e sua infraestrutura se tornaram cada vez mais obsoletas. A instabilidade financeira é apenas um dos problemas da economia ocidental, disse o analista econômico do Financial Times, Martin Wolf, em seu último livro, The crisis of democratic capitalism. É um texto longo, para uma crise profunda, à qual Wolf acrescenta outros fatores, como “o aumento da desigualdade, a crescente insegurança pessoal e o crescimento econômico lento, especialmente após a Grande Recessão”. O debate sobre o declínio do império norte-americano tem muitas arestas, mas está claro que o país que impôs as regras de Bretton Woods ao mundo hoje deve se esforçar para tentar mantê-las, antes que saiam do controle.

É o mesmo que fez da OTAN a espinha dorsal de sua política de defesa, uma organização beligerante que continua apertando o cerco contra a Rússia, aproximando-se cada vez mais de uma guerra nuclear da qual seus líderes parecem sonhar em sair vitoriosos. Permaneceremos, o resto do mundo, sendo meros espectadores de uma peça sobre o nosso fim? Os esforços de mediação da China, com a turnê do início de março de seu representante especial para assuntos da Eurásia, Li Hui, que incluiu Kiev, terão alguma chance de sucesso? Ou os de Lula, ou os de Petro, ou os do Papa Francisco? A única coisa inaceitável é esperar sentados enquanto a cortina cai…

Não teremos oportunidade de aplaudir!

*Gilberto Lopes é jornalista, doutor em Estudos da Sociedade e da Cultura pela Universidad de Costa Rica (UCR). Autor, entre outros livros, de Crisis política del mundo moderno (Uruk).

Tradução: Fernando Lima das Neves.


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